Gagueira induzida por estimulação magnética transcraniana

Posted on setembro 15, 2011

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Roger Highfield, editor do caderno de ciência do jornal Daily Telegraph: “As palavras significam tudo para mim. Mas agora, a área da fala em meu cérebro será desligada por um ímã gigante”.

No inusitado experimento mostrado abaixo, realizado no Instituto de Neurociência Cognitiva de Londres, vemos que é possível induzir momentaneamente gagueira em uma pessoa com fluência normal aplicando estimulação magnética transcraniana sobre seu córtex pré-motor dorsolateral esquerdo, responsável por desempenhar uma função essencial para a fluência da fala: a integração auditivo-motora.

No entanto, vemos também que o notável efeito de ruptura na fluência da fala espontânea não se repete quando a pessoa está cantando, fato que ajuda a responder uma das mais frequentes e recorrentes perguntas relacionadas à gagueira: “Afinal, por que gagos não gaguejam quando cantam?”.

A resposta simplificada que o experimento oferece a esta pergunta é que o cérebro possui regiões especializadas em hemisférios diferentes para realizar a integração auditivo-motora na voz cantada e na voz falada. Enquanto o processamento da voz falada ocorre predominantemente no hemisfério esquerdo, esse padrão de lateralização se inverte quando fazemos uso da voz cantada.

Já a resposta menos simplificada e mais completa é que o cérebro possui formas diferentes de realizar o sequenciamento motor na voz cantada e na voz falada. Enquanto o sequenciamento na voz falada é predominantemente implícito, inconsciente e maciçamente dependente de uma única pista de temporalização (a integração auditivo-motora feita em uma região específica do hemisfério esquerdo), o sequenciamento da voz cantada, por outro lado, é mais explícito e envolve várias pistas de temporalização complementares, muitas delas executadas pelo hemisfério direito, como o ajuste consciente da voz a um encadeamento rítmico, tonal e melódico predeterminado, resultando assim em um padrão muito mais difuso e menos lateralizado de processamento cerebral — e, consequentemente, menos sujeito a rupturas generalizadas*.

* Para mais informações sobre as diferenças de processamento cerebral na voz cantada e na voz falada, sugiro a leitura do artigo “Words in melody: an H215O PET study of brain activation during singing and speaking” (link para download).

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